Para quem não pode assistir a palestra de Mario Sergio Cortella, reproduzimos a análise deste grande filósofo brasileiro sobre Política.
Política é coisa de idiota?
Os gregos davam um nome apropriado a
quem cuidasse da vida pública, da comunidade e que acreditasse que a mais nobre
regra é "um por todos e todos por
um": este era chamado de político
"Política é
coisa de idiota!"
Mas
não poder ser! Essa
sentença aparece em comentários indignados, cada vez mais frequentes no Brasil, e,
em nome da verdade histórica, o que podemos constatar é que acabou se
invertendo o conceito original de idiota, pois a expressão idiótes, em
grego, significava aquele que só vive a vida privada, que recusa a política,
que diz não à política. Em outros termos, os gregos antigos chamavam de idiota a pessoa que achava
que a regra da vida é "cada um por
si e Deus por todos".
Os mesmos gregos davam um nome apropriado a quem cuidasse também da vida pública, da comunidade, e que acreditasse que a mais nobre regra é "um por todos e todos por um": este era chamado de político. E se entendia que todas e todas éramos e deveríamos ser políticos, a partir da noção de que pólis é a comunidade, a cidade, a sociedade, e é nela, com ela e por ela que vivemos.
No cotidiano, o que se fez foi um sequestro semântico, uma inversão do que seria o sentido original de idiota, a ponto de muitas e muitos hoje pensarem que só deixa de ser idiota aquele que vive fechado dentro de si e só se interessa pela vida no âmbito pessoal. Sua expressão generalizada é: "Não me meto em política".
Recusemos tal percepção negativa da política, pois afeta a convivência decente e saudável e, antes de mais nada, esquece que "os ausentes nunca tem razão". De fato, muitos se sentem assim em relação a um determinado modo de fazer política, mas não corresponde à ideia mais abrangente de política, dado que ausentar-se em nome da liberdade e do interesse próprio esbarra novamente no mundo clássico, para o qual o idiota não é livre (porque toma conta só do próprio nariz), pois entendiam que só é livre aquele que se envolve na vida pública, na vida coletiva.
Assim, a política é vista aí como convivência coletiva, mesmo que moremos cada um em nossa própria, usando o latim, domus, ou seja, em casa, nosso domínio. Porém, na prática, porque vivemos juntos e só assim o conseguimos, a questão é que não temos domus, só temos con-domínios. Viver é conviver, seja na cidade, ainda que em casa ou prédio, seja no país, seja no planeta.
A vida humana é condomínio. E só existe política como capacidade de convivência exatamente em razão do condomínio.
Os mesmos gregos davam um nome apropriado a quem cuidasse também da vida pública, da comunidade, e que acreditasse que a mais nobre regra é "um por todos e todos por um": este era chamado de político. E se entendia que todas e todas éramos e deveríamos ser políticos, a partir da noção de que pólis é a comunidade, a cidade, a sociedade, e é nela, com ela e por ela que vivemos.
No cotidiano, o que se fez foi um sequestro semântico, uma inversão do que seria o sentido original de idiota, a ponto de muitas e muitos hoje pensarem que só deixa de ser idiota aquele que vive fechado dentro de si e só se interessa pela vida no âmbito pessoal. Sua expressão generalizada é: "Não me meto em política".
Recusemos tal percepção negativa da política, pois afeta a convivência decente e saudável e, antes de mais nada, esquece que "os ausentes nunca tem razão". De fato, muitos se sentem assim em relação a um determinado modo de fazer política, mas não corresponde à ideia mais abrangente de política, dado que ausentar-se em nome da liberdade e do interesse próprio esbarra novamente no mundo clássico, para o qual o idiota não é livre (porque toma conta só do próprio nariz), pois entendiam que só é livre aquele que se envolve na vida pública, na vida coletiva.
Assim, a política é vista aí como convivência coletiva, mesmo que moremos cada um em nossa própria, usando o latim, domus, ou seja, em casa, nosso domínio. Porém, na prática, porque vivemos juntos e só assim o conseguimos, a questão é que não temos domus, só temos con-domínios. Viver é conviver, seja na cidade, ainda que em casa ou prédio, seja no país, seja no planeta.
A vida humana é condomínio. E só existe política como capacidade de convivência exatamente em razão do condomínio.
*Mario
Sergio Cortella é filósofo, professor-titular da PUC-SP e escreveu
com o filósofo Renato Janine Ribeiro (USP) o livro Política: para não ser
idiota (Papirus, 2010)
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